Ter uma dieta balanceada, escolher alimentos de qualidade para colocar no prato e evitar industrializados fazem parte de uma vida saudável. No entanto, quando essa preocupação é em excesso e a busca pela “dieta perfeita” passa a ser o centro da rotina diária, é sinal de problema. A ortorexia nervosa foi diagnosticada pela primeira vez no Brasil em 2005 e o número de casos não para de crescer, segundo diretora do Departamento de Distúrbios Alimentares da Associação Brasileira de Nutrologia, Maria Del Rosario Zariategui de Alonso. Ortoréxicos são viciados em comida saudável.

A princípio, querer sempre ingerir alimentos de qualidade pode não parecer doença, no entanto, conforme explicou Maria Del Rosario, portadores do transtorno excluem grupos de alimentos sem fazer a substituição adequada de nutrientes, ficam obcecados pela qualidade do que estão ingerindo e sofrem prejuízo na vida social. “Eles não consomem o que consideram ser impuro, com corantes, conservantes, pesticidas, gordura, sal, açúcar e genes modificados; se dedicam mais de três horas por dia entre planejamento, preparo e consumo da dieta; e são preocupados sobre as técnicas e materiais usados na preparação dos alimentos”, acrescentou a nutricionista e pesquisadora da USP, Alweyd Tesser.

“Eu não comia fora de casa, ainda tenho muito disso, fico pensando no que foi usado, que não foi bem preparado, como estavam as características do alimento, se a comida estava boa para ser consumida, dentro do prazo de validade, porque não dá para saber de onde a comida veio, se tem bactérias, quem fez a comida, como é a higiene da cozinha, não dá vontade de comer”, contou Fernanda Hinter, 21 anos. Aos 18 anos, Fernanda chegou a cortar completamente gordura, alimentos industrializados, e sal da dieta. A cada refeição, era bombardeada por uma série de questionamentos antes de decidir se comeria ou não o que estava no prato.

A obsessão pela dieta perfeita levou a jovem a se inscrever em um curso de nutrição e ao longo das aulas ela descobriu que estava sofrendo ortorexia. “Eu estava me sentindo mal, pressão baixa, perdi muito peso, mas para mim eu estava bem, não comia alimentos industrializados, não comia gorduras, não isso, não aquilo”, lembrou. Uma das características dos ortoréxicos, segundo Alweyd, é a busca excessiva por informações sobre alimentos e nutrição, e o transtorno é mais comum em estudantes e profissionais da área da saúde, com maior incidência em mulheres, informou Alweyd.

As causas são multifatoriais, desde bullying, “demonização dos alimentos”, campanhas midiáticas, entre outras, enumerou Maria Del Rosario. “Em 2014, existiam 30 milhões de sites e blogs pró-bulimia e anorexia”, exemplificou a especialista. O pontapé inicial também pode ocorrer no tratamento de doenças, segundo a nutricionista Iara Waitzberg Lewinski. Fernanda, por exemplo, iniciou a restrição alimentar após cirurgia para remover pedras nos rins. “Os médicos falaram que podia ser genético, excesso de sal e que a gordura ajudava a provocar as pedras”, lembrou.

Diagnóstico e tratamento

“Uma das dificuldades é que o paciente ortoréxico pode mascarar a obsessão pela dieta alegando uma alimentação vegetariana ou vegana com o propósito de ficar mais saudável”, afirmou Iara, especialista em nutrição vegetariana. As pessoas não buscam ajuda até precisarem de hospitalização pela gravidade, segundo Maria Del Rosario. Geralmente, são os familiares que levam o ortoréxico ao médico: “Tive um paciente de 17 anos, trazido pela mãe, que chegou a emagrecer 35 quilos, ficou com deficiência de vários nutrientes, após restrições alimentares em busca de dieta saudável. A vida social dele era inexistente, passava o dia competindo com amigos virtuais quem restringia mais alimentos”, relatou.

O primeiro diagnóstico de ortorexia foi feito pelo médico norte-americano Steven Bratman, e ele descreveu os seguintes critérios para a identificação do transtorno:

  • Passa mais de 3 horas pensando sobre uma dieta saudável?
  • Se preocupa mais com a qualidade do que com o prazer das refeições?
  • A qualidade de vida diminui enquanto a qualidade da dieta aumenta?
  • Se sente culpado quando se dispersa das crenças dietéticas?
  • A maneira de comer deixa isolado?

O tratamento inclui psicoterapia, medicação para o transtorno obsessivo-compulsivo e reposição nutricional, segundo Maria Del Rosario. “O nutrólogo deve fazer o tratamento das complicações, como anemia, osteopenia, deficiência de nutrientes, vitaminas e minerais, e intolerâncias alimentares. E o psicólogo e o nutricionista devem intervir após a correção dos distúrbios cognitivos provocados pelos déficits de nutrientes”, detalhou a nutróloga.

Fonte: Yahoo Vida e Estilo