50 verdades. Todos que trabalham em uma cozinha irão se reconhecer na maioria dos (senão todos)  pontos abaixo. Gostaria porém, que fossemos valorizados pelos nossos talentos e não somente pela resiliência do que as vezes considero absurdos de nossa rotina.

Acredito que podemos e devemos deixar um legado para as próximas gerações. Não há paixão que dure quando o corpo padece e o salário não paga as contas. A gastronomia não deveria selecionar seus profissionais somente pela resistência física ou psicológica.
É importante compreender  que a cozinha profissional não é um ambiente para todos. Não há glamour algum (ainda bem…rs). Somos de uma cultura muito particular, com idioma próprio, objetivos e sonhos muito peculiares. Mesmo com contra cheques irrisórios e inversamente proporcional a força de trabalho,  seguimos em frente. Temos o prazer de trabalhar ao lado de pessoas inteligentes, expressivas e fortes. Homens e mulheres que aguentam horas e horas de trabalho árduo, em ambientes hostis com temperaturas elevadas, panelas fumegantes, objetos cortantes em uma harmonia digna de uma orquestra sinfônica.

Precisamos contudo quebrar certos paradigmas; Nem todo cozinheiro será um excelente chefe de cozinha porém, necessariamente, um chefe de cozinha PRECISARÁ SER UM EXCEPCIONAL COZINHEIRO. Que fique bem claro, de uma vez por todas, a chefia não é o ápice da vida de um cozinheiro e sim uma possibilidade de carreira. Se o mundo entender isso, talvez tenhamos mais cozinheiros e menos dólmãs recheadas de pseudos profissionais nas capas das revistas de gastronomia e programas culinários representando nosso ofício.
Destes cozinheiros (após anos de experiência profissional) não deveria ser cobrada somente as somas dos quilos de batatas descascadas e sim, (mediante sua capacidade profissional) suas sinceras opiniões sobre a construção de novas receitas, testando possibilidades e valorizando cada dia dedicado, cada noite em claro na construção de uma carreira.

Eu poderia finalizar esta coluna no parágrafo acima. Porém na busca por essa transformação profissional, costumamos hipotecar ao outro as responsabilidades inerente a nossa realidade. E a culpa é sempre do mercado que não nos valoriza, do patrão que não reconhece nosso esforço. Contudo ao nos excluirmos do problema, nos afastamos da solução.

Quantos de nós já não tivemos a possibilidade de chefiar a própria equipe, e ao nos encontrarmos na difícil posição de gestor, repetimos erros que outrora condenávamos? E nos vemos muitas vezes obrigados a tal, por vivermos em uma país de altas cargas tributárias e custos operacionais absurdos, que inviabilizam qualquer possibilidade de aumento salarial ou melhoria estrutural … Tudo acaba se tornando um grande ciclo vicioso.
E como mudar? Se reinventando, eu arriscaria. Mudando conceitos pré-estabelecidos de que para se abrir um restaurante, ele precisa ser estrelado. O sucesso sempre é fruto de uma história. E isso normalmente é negligenciado no planejamento de um novo negócio gastronômico. Somos invadidos por uma sensação infantil de que os sonho precisam ser realizados em um curto espaço de tempo, para que o esforço e de dedicação seja recompensado com o sucesso. Mas não funciona desta forma. O mercado da restauração faz parte de um investimento a longo prazo, onde o prazer deve ser encontrado no caminho, com objetivos a curto, médio e longo prazos, pré estabelecidos constantemente. Não é preciso somente conhecer o ofício. Para abrir um restaurante, é necessário uma história entre as panelas e uma excelente visão de negócios e estratégias.
Se não for possível uma cozinha clássica francesa com 120 lugares no salão, faça uma brasileira com 20 mesas e uma cozinha enxuta, sem facas japonesas, batedeiras americanas e panelas francesas. Caminhe com cautela, dando os passos possíveis mediante a realidade apresentada… Sem mexer na qualidade ou criatividade que nos é inerente. E valorizando os verdadeiros protagonistas das nossas vitórias, nossos cozinheiros.Entendo que nem sempre um cozinheiro corresponderá as expectativas, por mil motivos. Estamos lidando a natureza humana, e ela é falha. Mas se não entendermos de uma vez por todas que estamos construindo essa história juntos, jamais evoluiremos. “Seja a mudança que você quer ver no mundo”- Mahatma Gandhi

Quer trabalhar em uma cozinha? Conheça nossa realidade então e saiba que alguns pontos queremos e iremos mudar, mas outros, nos trazem orgulho e nos distinguem dos demais terráqueos…

1. Você quase sempre terá feridas abertas em suas mãos e braços.

2. Você nunca vai conhecer novas pessoas, porque a sua vida social praticamente não existirá.

3. Você vai achar difícil iniciar relacionamentos.

4. Você vai perder suas habilidades sociais

5. Seu senso de humor irá se degradar e limitar ao politicamente incorreto e socialmente inaceitável.

6. Você começará a suar como um porco sem nem mesmo perceber.

7. Você vai se transformar em um maníaco e sempre tentar levar todas as conversas ao assunto comida.

8. Você vai ganhar uma miséria por anos/décadas.

9. Você irá ou perder uma grande quantidade de peso, ou ganhar uma grande quantidade de peso.

10. Você nunca terá um bronzeado.

11. Você não vai ser famoso.

12. Você vai desenvolver algum vício, seja café, cigarros, álcool, jogos de azar…

13. Seus pés vão ficar destruídos.

14. Suas costas ficarão destruídas.

15. Suas mãos vão ficar destruídas.

16. Você vai viver em um constante estado de privação de sono.

17. Você terá que pedir a seus amigos para planejar tudo em torno de sua agenda, porque você nunca sabe seus dias de folga e você provavelmente não será capaz de muda-los.

18. Você vai se tornar uma pessoa mais rude.

19. Você vai se tornar mais resistente as chamas de um fogão.

20. Sua tolerância com a falta de eficiência e bom senso das outras pessoas diminuirá drasticamente.

21. Você vai passar a maior parte de sua vida confinado em uma pequena sala com pouca ventilação, sem decoração, com altas temperaturas, muita umidade, ruídos, sem luz natural ou janelas e, com um pequeno grupo das mesmas pessoas.

22. Você vai trabalhar mais horas do que você jamais imaginou ser possível.

23. Você vai gastar todas as suas horas de trabalho em pé, não podendo sentar nem por míseros 5 minutos.

24. Seus dias mais curtos de trabalho vão ser maiores que o mais longo da maioria das pessoas, e os seus dias de trabalho mais longos, que compõem cerca de metade de sua semana de trabalho, vão ser mais longos do que as horas que uma pessoa normal passa acordada.

25. Você não vai cozinhar jantares gourmet em casa. Você vai estar muito cansado, e de saco cheio.

26. Você provavelmente vai começar a comer fast-food ou qualquer porcaria.

27. Você vai ser objeto de abuso, seja físico ou emocional. Oficialmente, será como teste de caráter. Na realidade, vai ser como uma forma de entretenimento.

28. Você vai acabar gastando tanto tempo no trabalho que seus colegas vão conhecê-lo melhor do que o seu parceiro / família / amigos.

29. Você vai se reunir e formar laços fortes com os tipos de pessoas que você nunca antes sequer havia imaginado conhecer.

30. Você estará em um estado constante de stress.

31. Você nunca será insubstituível e espera-se que constantemente dê 110%

32. Você sempre estará exausto.

33. Você não poderá faltar ao trabalho com desculpinhas do tipo “com dor de barriga” ou “doente” ou “minha avó morreu”.

34. Você deverá colocar o seu trabalho antes de qualquer outra coisa em sua lista de prioridades.

35. Você nunca vai ser elogiado.

36. Você terá de tratar os seus superiores como senhores absolutos e nunca responder de volta, tentar explicar-se, iniciar uma conversa, ou mostrar qualquer outro tipo de insubordinação, mesmo que você saiba que eles estão errados ou sentir como se o comportamento em relação a você é inaceitável.

37. Vai tornar-se muito difícil ver os seus amigos cozinharem.

38. Sua mãe vai parar de cozinhar para você, porque ela se sente intimidada.

39. Pedirão para você cozinhar em todos encontros familiares, como no Natal, por exemplo. Felizmente, pelo menos um ano ou dois, você estará trabalhando no Natal.

40. Pelo menos um ano ou dois, ou até mesmo talvez todos os anos, você vai trabalhar no Natal, Reveillon, Páscoa, Dia dos Namorados, Dia das Mães, dos Pais, feriados, o seu aniversário, e praticamente todos os outros dias festivos do calendário.

41. Você vai ter que trabalhar muitos anos em posições subalternas antes de atingir qualquer nível de autoridade no ambiente de trabalho.

42. Quanto melhor é o restaurante é, mais as horas de trabalho, mais pressão, menos saudável o seu estilo de vida irá se tornar, mais provável você desenvolverá um vício, o mais competitivas as pessoas ao seu redor serão, menos horas de sono você vai ter, menos você vai comer, etc.

43. Você vai constantemente cometer erros, e cada vez que você cometer um erro, alguém irá fazer você entender que você é, evidentemente, uma MULA, porque somente uma MULA poderia cometer tal erro.

44. Se você é mulher, você vai ser constantemente alvo de observações duvidosas, piadas, e insinuações.

45. Nenhum de seus amigos ou familiares vão entender o que está envolvido no seu trabalho e você nunca será capaz de fazê-los entender.

46. Você vai gastar boa quantidade do seu dinheiro em equipamentos, livros, comer em bons restaurantes, o que vai deixar você com não muito dinheiro para outras coisas, ou praticamente para nada.

47. Você irá desenvolver uma obsessão assustadora por facas.

48. Se você é um chefe de confeitaria, você irá desenvolver uma obsessão assustadora por colheres.

49. Você vai ter uma coceira em todas suas dobras a partir da mistura de suor, calor e fricção que nunca irão curar bem , às vezes ficarão infectadas, e coçarão a maior parte do tempo.

50. Se você é o tipo certo de pessoa, você vai se apaixonar pelo seu trabalho e nunca olhar para trás.

Fonte: Guterman Gastronomia