Os pithiviers de pato do histórico Clown Bar, restaurante parisiense dos anos 1920 de temática circense, são uma caprichada releitura de um prato clássico – o original é uma célebre sobremesa. O peito de pato rodeado por carne moída da ave, encimado por foie gras e cozido dentro de tortinhas, é um tenro argumento a favor da veneração da cozinha francesa tradicional. Os pithiviers são tão franceses quanto as férias de quatro semanas. Já os do Clown Bar são uma criação do chef Sota Atsumi, de Tóquio.

Atsumi, de 30 anos, é parte de uma nova geração de chefs japoneses empenhados em dominar a cozinha francesa. Eles estão à frente de alguns dos mais aclamados restaurantes parisienses do momento – o que é notável numa cidade famosa por esnobar estrangeiros. Le Fooding, talvez a mais influente publicação gastronômica da França atual, elegeu o Clown Bar o melhor bistrô da França em 2015.

Alguns desses chefs, como Dai Shinozuka, do Les Enfants Rouges, são tão ortodoxos que sua comida poderia ilustrar um livro de receitas. Outros, como Shinichi Sato, do Passage 53, classificado com duas estrelas Michelin, ou Atsushi Tanaka, do Restaurant A.T., vão para uma cozinha modernista.

Eles se mudaram para a França para aprender com os medalhões da culinária francesa e assimilar tradições e técnicas dessa cozinha. “Você pode impressionar japoneses com sua cozinha francesa, mas o que eu quero é fazer culinária francesa para franceses”, diz Katsuaki Okiyama, de 39 anos, chef do restaurante Abri. Okiyama nasceu nas imediações de Tóquio e estudou culinária francesa no Japão antes de se mudar para a França, onde trabalhou no Taillevent e no La Table (de Joël Robuchon, hoje fechado), duas cidadelas da cozinha tradicional parisiense.

Chefs japoneses cozinham em Paris há algum tempo. Alexandre Cammas, editor de Le Fooding, lembra-se de que alguns deles comandavam cozinhas de restaurantes com estrelas Michelin já nos anos 1990. Ele diz que recentemente muitos dessa nova geração estão abrindo pequenos restaurantes, cuidadosamente informais, que vêm mudando a cena culinária de Paris. São membros de carteirinha da bistronomie, que leva a sofisticação e a técnica da culinária fina a restaurantes saborosamente descontraídos da periferia, onde garçons informais e bem-humorados são mais inclinados a indicar vinhos naturais baratos do que caríssimos grand crus.

Esses restaurantes ambiciosos, mas acessíveis, estão criando uma nova cultura gastronômica, cultivando uma jovem e bem informada clientela. Algumas das mais refinadas cozinhas de Paris são hoje encontradas em restaurantes jovens, barulhentos e divertidos. Os chefs parisienses nascidos no Japão são parte integral desse movimento. “O grande crescimento dessas casas ocorre há uns três anos”, diz Cammas. A atual edição de Le Fooding traz um “Japaname Tour” de Paris, com um mapa fartamente ilustrado. A reportagem lista 40 restaurantes comandados por chefs japoneses, 28 dos quais catalogados como “japarisiennes”, fusão que significa chefs japoneses fazendo cozinha francesa.

Não é fácil vencer culinariamente em Paris. Afinal, culinária é mais do que comida e fonte de prazer na França: é parte importante da identidade nacional. A ponto de, em 2010, a Unesco ter considerado a culinária tradicional francesa uma herança cultural a ser preservada. A refeição francesa padrão, descrita na ocasião, deve começar com um aperitivo e ter pelo menos quatro pratos sucessivos.

Chefs como Atsumi e Okiyama são tão guardiões desse legado como qualquer chef francês de nascimento. “É uma questão de talento e paixão, uma questão de alma”, diz Cammas. “O mil-folhas do Abri é um dos melhores que se podem provar”, afirma ele, referindo-se à interpretação de Okiyama da intrincada sobremesa francesa.

Fonte: The New York Times/ Tradução Paladar